A
Federação constitui um tipo de Estado composto que é divisível em partes
internas e que são unidas entre si por um vinculo de sociedade. Grande
quantidade de países admite esta solução, a começar pelos Estados Unidos da
América com sua Lei Magna de 1787.
Sob
o ponto de vista conceitual, pode-se chegar à seguinte definição do Estado
Federal: “o Estado Federal é uma organização, formada sob a base de uma
repartição de competências entre o governo federal e os governos estaduais, de
sorte que a União tenha a supremacia sobre os Estados-Membros, e estes sejam
entidades dotadas de autonomia constitucional.” (FERREIRA, Pinto.
Curso
de Direito Constitucional. 7ª Ed., São Paulo: Editora Saraiva, 1995,
pág. 262.)
A
vocação histórica do Brasil para o federalismo surgiu, principalmente, em
virtude das próprias condições geográficas do país, pois a imensidão
territorial e as condições naturais obrigaram a descentralização, que é base do
regime federativo. A causa social da origem do federalismo é a própria
imensidão territorial, obrigando a descentralização de governo, a fim de manter
a pluralidade das condições regionais e o regionalismo de cada zona, tudo
integrado na unidade nacional do federalismo.
Durante
o período histórico da dominação portuguesa, o Federalismo decorreu a partir de
uma criação social que correspondia às aspirações descentralizadoras, a exemplo
da Guerra dos Farrapos, Revolução Praieira, Confederação do Equador, entre
outras. A sufocante asfixia administrativa portuguesa passou a ser um perigo à
própria unidade nacional. Em razão disso, o Império deu origem aos Atos
Adicionais que outorgavam autonomia a certas coletividades integrantes do
governo, como os Conselhos-Gerais, entre outras. Foi com essa estrutura que as
províncias viveram durante a longa existência dos dois reinados, até a
Revolução de 1889, transformando-as em Estados-Membros.
Desta
feita, a Constituição Federal de 1891, em seu art. 63, instituiu que cada
Estado-Membro reger-se-ia pela Constituição e pelas leis que adotar,
respeitados os princípios constitucionais da União. A Federação, então,
pressupunha a existência de várias ordens jurídicas autônomas e harmonicamente
independentes, como ocorre hoje em dia.
Amiúde
o desenvolvimento histórico do Federalismo no Brasil, a Constituição de 1988
inovou ao estabelecer o pacto federativo, tradicionalmente feito pelos
Estados-Membros, criando a União e incluindo os Municípios. Ao incluir os
Municípios, foi propiciada a autonomia político-administrativa destes,
consagrando-os no elenco de entes federados.
O
regime federativo constitui uma forma de Estado de grande importância no mundo
moderno, daí resultando sem dúvida a vitalidade do vínculo de atribuições de
competências. Verifica-se, por conseqüência, a diversidade da organização que
se efetua no regime federativo em vários países, sem desmantelo da sua técnica,
antes atendendo às necessidades dominantes em uma determinada época.
Para
o cumprimento dos fins do regime federativo, é indispensável que se estabeleça
uma divisão ou uma repartição de competências entre a União e os
Estados-Membros para que não se processem conflitos desagregadores do regime e
a ruína do aparelhamento administrativo. Daí a importância da ordem jurídico-constitucional
das competências.
Entenda-se
por competência a capacidade jurídica de uma corporação pública ou ente
federado para agir. Em que pese a gama de competências atribuídas à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, uma das mais importantes
competências diz respeito ao poder de tributar. Eis que surge o que
convencionamos a chamar de Federalismo Fiscal.
O
Federalismo Fiscal pressupõe a atribuição aos entes federados de competência
tributária suficiente para propiciar arrecadação tributária adequada para o
cumprimento de suas atribuições, obedecendo aos anseios e peculiaridades de
cada região.
Pela
atribuição de competência divide-se o próprio poder de instituir e cobrar
tributos. Entrega-se à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios
parcelas do próprio poder de tributar. A faculdade de instituir tributo passa
pelo princípio do Poder-Dever, atribuído pela Constituição, para que
determinado ente da Federação possa instituir certo tributo.
A
técnica de atribuição de competência é de grande importância porque tem a
virtude de descentralizar o poder político, mas tem o inconveniente de não se
prestar como instrumento para a minimização das desigualdades econômicas entre
os Estados e os Municípios. Além disso, torna dispendiosa a forma de governar o
país, conquanto não há um controle da relação entre receita e despesa, o que
causa déficit nas contas públicas.
Ressalta-se
que a fragmentação partidária em nosso país, provocada não apenas pela
heterogeneidade estrutural da sociedade, mas também pela permissiva legislação
eleitoral, somando-se com o fato de que Estados e Municípios constituem um
poderoso fator potencial de descontrole do déficit público devido ao seu grande
peso dentro do setor público, são fatores que agregam à forma dispendiosa de
governar o país.
Eis
que surge também a “guerra fiscal” entre os Estados, mediante a manipulação do
ICMS e a concessão de benefícios disfarçados em forma de empréstimos
subsidiados e até participações acionárias. A “guerra” deflagrada, sob os
auspícios do federalismo, tem óbvias vantagens, como a localização de mercado e
a infra-estrutura social e econômica dos Estados em relação aos menos
desenvolvidos, o que torna dispendiosa a administração.
Não se pode olvidar que, ao
Estado pobre, em cujo território não é produzida, nem circula, riqueza
significativa, de nada valeriam todos os tributos do sistema sem a justa
distribuição de riquezas. Por isto é que se fez necessária também a
distribuição de receitas tributárias. Pela distribuição de receitas, o que se
divide entre a União, Estados e Municípios é o produto da arrecadação do
tributo por uma delas instituído e cobrado.
Na
verdade, existem duas formas de participação de uma pessoa política no produto
da arrecadação de outra: a direta e a indireta. A forma direta impõe uma
relação simples. Exemplo: os Municípios fazem jus a 25% do ICMS do Estado
arrecadado em seus territórios. A forma indireta impõe uma relação complexa:
são formados por fundos aos quais afluem parcelas de receitas de dados
impostos. Depois, são rateados entre os partícipes beneficiários segundo
critérios legais preestabelecidos.
Por
outro lado, tendo à União sido reservada parcela maior da competência
tributária, os Estados-Membros e os Municípios, todavia, participam do produto
da arrecadação de diversos impostos federais. No entanto, a técnica de
distribuição de receitas tem o inconveniente de manter os Estados e os
Municípios na dependência do Governo Federal, a quem cabe fazer a partilha das
receitas tributárias mais expressivas.
O
problema tende a agravar ainda mais se o Governo Federal aprovar a comentada
reforma tributária, o que concentrará ainda mais o poder de tributar nas mãos
da União, logrando aos Estados e Municípios o ônus de viver em constante “negociação
política” com o Governo Federal.
Na
verdade a questão não se subsume ao centralismo fiscal, mesmo porque não
haveria como gerir e administrar concentradamente diante das peculiaridades de
um país tão heterogêneo e de dimensões físicas e populacionais tão grandes.
O
grande desafio para a federação brasileira passa a ser, portanto, como
conciliar a descentralização fiscal, maior ou menor, com os objetivos nacionais
e racionais da política econômica. Esse é um problema ainda não equacionado. O
que tem que acabar urgentemente é a sangria desatada criada historicamente pela
União, que age como uma espécie de “emprestadora de última instância de Estados
e Municípios em situação de falência”, acabando, por conseguinte, com o
comportamento fiscal permissivo.
O
diagnóstico parece se traduzir em medidas conciliadoras, no entanto, sem perder
o vigor fiscal, aperfeiçoando o sistema federativo fiscal e dando ênfase aos
mecanismos de controles fiscais. O exemplo disso está esculpido no art. 160 da
Constituição, que veda à União Federal a “negociação política” na entrega das
receitas cabentes a Estados e Municípios, sob as penas da lei, providência de
resto salutar, pois o Governo Federal sempre usou o processo de entrega dessas
parcelas para obter vantagens políticas e, quem sabe, econômicas, favorecendo a
corrupção e em benefício de uns poucos.
O
federalismo fiscal brasileiro projeta o quadro geral da economia do país, da
sociedade e do sistema político. A política do atual Governo Federal em relação
à questão federativa tem, de fato, procurado enfrentar os problemas mais
candentes, embora dentro de uma estratégia de ação gradual, relativamente
prudente e mais custosa do ponto de vista financeiro.
Enfim,
a federação brasileira, diferentemente do que acontece com outros países,
aparenta ser inconclusa, mas exibe traços de razoável estabilidade. É por esse
motivo que o federalismo fiscal é sempre invocado na defesa de interesses
localizados e de políticas públicas de impacto regionais.