quarta-feira, 20 de junho de 2012

O PAPEL DO ESTADO BRASILEIRO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR




            A educação, enquanto dever do Estado e realidade social vivenciada, não foge ao controle do Direito. Na verdade, é a própria Constituição Federal pátria que a enuncia como direito de todos, dever do Estado e da família, com a tríplice função de garantir a realização plena do ser humano, inseri-lo no contexto do Estado Democrático e qualificá-lo para o mundo do trabalho. A um só tempo, a educação representa tanto mecanismo de desenvolvimento pessoal do indivíduo como da própria sociedade em que ele se insere.
            No Brasil, a atividade educacional é essencialmente função pública, mas não é privativa do Estado, conforme dispõe a Constituição da República, em seu artigo 205 e 206, III. Enseja, portanto, a prestação direta pelo Estado, com a participação da comunidade, bem como a prestação pelo particular, sem prejuízo da colaboração entre ambos, mediante técnicas de fomento ou parcerias (CF, art. 209). Em qualquer situação, prevalece a atuação controladora e intervencionista do Estado.
            Tratando a educação como direito de todos, e distinguindo os direitos naturais, sempiternos e não escritos; dos direitos fundamentais, constitucionalmente positivados e dos direitos humanos, positivados em nível internacional, vê-a como direito fundamental prestacional (MALISKA, Marcos Augusto. O Direito à Educação e a Constituição. Porto Alegre: Sérgio Fabris Editor, 2001, p. 243), como enfatiza Marcos Augusto Maliska, que desafia prestações do Estado, presente no núcleo irredutível da Carta de Direitos brasileira e dotada de aplicabilidade imediata, com implicações para terceiros, notadamente as entidades educacionais da iniciativa privada. Nesse sentido, “seria o ensino privado colaborador do ensino público” (MALISKA, Marcos Augusto. Op. Cit., p. 189). Importa-se destacar o papel colaborador da iniciativa educacional privada.
            Como corolário das competências legislativas, a estrutura do sistema educacional brasileiro assenta sobre o modelo do Estado Federal. Nesse sentido, percebe-se que a lei de diretrizes e bases da educação nacional representa o regramento em nível nacional, correspondendo à articulação e coordenação dos sistemas de ensino. Por outro lado, a competência para edição de normas em matéria de educação e ensino prevista no artigo 24, IX garante a atuação dos Estados no tratamento de questões específicas, importante instrumento para atender a variedade de situações decorrentes da extensão e das desigualdades do País.
            Por tal mister, o Estado brasileiro contemporâneo passou a ter presença expressiva no campo da educação superior, pois: planeja, define políticas e as executa; legisla; regulamenta; interpreta e aplica a legislação, por meio dos Conselhos de Educação; financia e subvenciona o ensino, a pesquisa e a extensão de serviços; mantém universidades e demais instituições públicas de ensino superior; oferece diretamente ensino de graduação e pós-graduação; autoriza, reconhece, credencia, recredencia, supervisiona cursos e instituições; determina sua desativação; avalia alunos, cursos e instituições, em todo o País; interfere na organização do ensino; estabelece diretrizes curriculares etc.  Tudo se dá nas esferas pública e privada e em relação a todos os sistemas de ensino.
            É certo, porém, que o ensino superior público tem dificuldades para crescer à vista da débil disponibilidade dos recursos a ele oferecidos. É igualmente certo que o ensino superior privado não consegue atender à demanda, apesar da ampla oferta de vagas, em vista do baixo poder aquisitivo da população que, inclusive, queda-se desestimulada para a busca de oportunidades de aprendizagem. É claro, pois, que essas duas esfinges carecem de financiamento, de sorte a que a eqüidade entre os jovens possa ser registrada. A garantia da universalidade de oportunidades de acesso, fruto da expansão, somente tem sentido se se registrar a efetiva aprendizagem dos alunos. Se o labor escolar não resultar em aprendizagem, terá sido um mero diletantismo entre professores e alunos.
            É cediço, por outro lado, que a Teoria Econômica mostra as situações em que é necessária a ação estatal, seja para aumentar a eficiência da economia, seja para melhorar a distribuição de renda. No primeiro caso, têm-se principalmente as situações de concorrência imperfeita (oligopólios e monopólios), a existência de bens públicos e as externalidades, falhas no mercado de capitais e informações imperfeitas para os consumidores. Além disto, mesmo num mercado de concorrência perfeita, o governo pode obrigar o cidadão a fazer o que se presume ser bom para ele, como é o caso da educação elementar compulsória. Da mesma forma, o governo pode agir, mesmo numa situação de máxima eficiência econômica, se a renda estiver mal distribuída, e parte da população não tiver acesso  adequado a bens e serviços básicos.
            Normalmente, antecede à implantação de uma economia de mercado a existência de um Estado intervencionista, que empreende segundo suas próprias regras, impedindo a atuação dos agentes privados e da própria sociedade no desenvolvimento socioeconômico de um país. Disto se depreende que, historicamente, o Estado intervencionista se transforma num Estado regulador, de forma a garantir o interesse público, deixando o interesse privado para ser regulado pelos mecanismos de mercado, devidamente orientados para a competição. Somente um mercado regulado para a competição pode produzir os reais benefícios que se espera para a sociedade: disponibilidade de produtos e serviços, com qualidade, segurança e preços competitivos. Isto significa, em outras palavras, reservar ao Estado o estabelecimento de regras claras para o jogo, deixando aos capitais privados a tarefa de produzir. A atividade regulatória no País tem acompanhado, de um modo geral, o processo de atuação do Estado ao longo dos anos, uma atuação intervencionista que, mesmo tendo obtido resultados, impediu ou dificultou a participação de agentes econômicos no seu processo de desenvolvimento.
            Nesse sentido, a participação Estatal na Educação Superior deve se dar na direção da maior eficiência do sistema e no sentido da melhor distribuição de renda. No primeiro caso, a ênfase deve ser colocada no oferecimento de cursos de educação superior socialmente relevantes e de boa qualidade. Os programas de fomento e os recursos para pesquisa devem estar acessíveis a todas as instituições, recebendo-os aqueles que apresentarem os melhores projetos. Do ponto-de-vista da distribuição de renda, o foco tem que estar no estudante carente de bom aproveitamento. Esta é uma medida lógica, pois não se podendo atender a todos os estudantes carentes por vários fatores de ordem econômico-financeira, deve-se escolher os de mais capacidade, em cursos de melhor qualidade e de maior interesse social. Este deveria ser o papel do Estado enquanto atue de forma regulatória, como acontece contemporaneamente.

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